Homilia – Abertura do Ano Jubilar

        O Ano Jubilar que hoje iniciamos para assinalar o Centenário da Diocese de Vila Real é uma grande graça. Uma graça de Deus e uma deferência do Papa Francisco. O nosso sentimento mais profundo encontra eco na frase de São Paulo na Carta aos Efésios: «Bendito seja Deus, Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, que do alto dos céus nos abençoou com toda a espécie de bençãos espirituais em Cristo» (Ef, 1,3). De facto, é uma bênção de Deus fazermos parte desta Igreja de Jesus Cristo que está nestas terras de Vila Real de Trás-os-Montes. Ao longo destes anos Deus abençoou os homens e mulheres desta bela terra, caminhou connosco e ajudou a consolidar a vida da Igreja que somos. Foi nesta comunidade diocesana que muitos receberam a graça do batismo e da filiação divina, foram iniciados na fé, sem esquecer todos aqueles que neste período, pelo sacramento da ordem entregaram a sua vida ao serviço pastoral deste povo.

        Um ano jubilar é antes de mais um tempo intenso de ação de graças pelas maravilhas que Deus realizou em nosso favor ao longo deste século. Embora as raízes do cristianismo nestas terras transmontanas e durienses sejam milenares, o período da última centúria foi particularmente rico de vida espiritual, de realizações pastorais e sociais, de crescimento das comunidades e instituições que fazem parte da diocese. O rito inicial desta celebração com a entrada solene pela porta principal da catedral, gesto que todos são convidados a repetir ao longo deste ano, é simbólico e evocativo do caminho histórico deste povo, acolhido por Deus na casa-mãe da diocese, onde se reúne para celebrar a sua fé.

        No momento de abertura deste ano especial, endereço a todos o convite a uma atitude de verdadeiro júbilo e de alegria interior, alicerçada no reconhecimento das riquezas que Deus nos tem concedido e na gratidão pelo dom de tantas vidas que serviram esta diocese com a totalidade do seu ser. É um elenco vasto de padres e bispos, religiosos e religiosas, leigos e famílias, de homens e mulheres, cujo testemunho de vida e de fé não se pode apagar da nossa memória coletiva.

        A celebração festiva não significa que esquecemos as faltas e equívocos que fazem parte do nosso percurso pessoal e comunitário. Como Adão no relato do livro do Génesis, sentimos vergonha pelas infidelidades e pecados cometidos. Não o fazemos por medo ou autoflagelação, mas confiantes de que Jesus, Filho de Maria, nos salva do mal, nos perdoa o pecado e assim nos dá a esperança de um futuro mais livre. Este exercício penitencial é necessário num ano jubilar em que temos a possibilidade de alcançar a indulgência das nossas faltas. É um exercício que supõe humildade e sabedoria, mas ao mesmo tempo, é libertador, além de profético para uma sociedade em que tantos se acham acima do bem e do mal o que acarreta consequências preocupantes como a perda do sentido do pecado, a desresponsabilização pelos erros e a banalização do mal.

        Este olhar retrospetivo que evidencia glórias e algumas sombras, é indispensável para ajudar cada um de nós a tomar uma consciência mais viva e forte do seu papel na vida presente desta Igreja Local. O ano jubilar deverá servir para confirmar e reforçar a convicção de que a missão de cada um, clérigo ou leigo, é essencial no caminho desta comunidade diocesana. Todos e cada um são pedras vivas, indispensáveis à construção da Igreja do futuro. Os traços fundamentais do sentido dessa missão podem ser identificados no trecho paulino: Deus nos escolheu, nos predestinou, nos constituiu herdeiros. De facto, Deus nos escolheu e nos chamou à vocação maior e comum, a de sermos santos; nos predestinou para sermos seus filhos adotivos e irmãos em Jesus Cristo e como herdeiros nos confiou o seu Reino para que o façamos crescer na história, usando os talentos que nos deu.

        A Solenidade que hoje celebramos, Nossa Senhora da Conceição, apresenta-nos Maria, nossa Mãe e Padroeira da diocese, como modelo porque soube cumprir fiel e plenamente essa missão divina. Aquela jovem de Nazaré foi capaz de escutar o plano de Deus transmitido pelo Anjo Gabriel, um plano surpreendente; soube acolher e confiar na força do alto, ser dócil à ação do Espírito e por fim responder com coragem, dispondo a totalidade do seu ser para servir a Deus.

Em Ano Jubilar em que invocamos a intercessão da nossa padroeira, aprendamos com o seu exemplo de mãe e de crente. A cada um de nós, clérigo ou leigo, homem ou mulher, é pedido hoje uma maior capacidade, atenção e disponibilidade interior para a escutar a Deus, atender àquilo que Ele nos pede ou chama a fazer na nossa situação concreta. Como Maria confiemos na ação do Espírito porque acreditamos que Ele conduz a Igreja e nos dá força e imaginação para realizar o que só com as nossas capacidades e meios seria impossível. Com a sua ajuda materna renovemos o nosso compromisso de batizados ou de pastores para servir a Deus e ao seu povo.

        Neste dia a Igreja encerra também o ano dedicado a São José. Ao chamar à atenção para esta figura, o Papa Francisco exaltou-o como alguém que tinha um «coração de pai»: pai na ternura, no acolhimento, na obediência, no trabalho e na sombra. São expressões bem distantes do catálogo das palavras da moda, mas que traduzem um modo sério de estar na vida e na Igreja. Neste dia, agradeçamos a São José, patrono da Igreja universal, todas as graças que recebemos pela sua intercessão nas nossas vidas, famílias e comunidades. A referência a esta figura decisiva no Natal do Senhor, permite evocar as pessoas mais simples e anónimas, que não tendo ocupado lugares de destaque, foram essenciais, apesar da sua discrição, para a vida da diocese, nas suas comunidades, grupos e instituições.

Por último, importa sublinhar que este Ano Jubilar coincidirá, em larga medida com a fase de preparação do próximo Sínodo. Trata-se de uma excelente oportunidade para tomarmos consciência de que celebrar um centenário, além de evocação dos feitos realizados, constitui um forte apelo a todos para um renovado empenho na construção do futuro. Para isso teremos de «caminhar juntos», como nos desafia o Papa Francisco, ou seja, de crescer e avançar em espírito sinodal. Mais do que caminhar depressa como alguns utópica e precipitadamente exigem ou andar para trás como uns poucos suspiram, importa sobretudo que caminhemos juntos, todos juntos. Não é tarefa fácil devido a falta de hábito, a interesses, resistências ou tentações de protagonismo, ou até à falta de um sentido amplo de Igreja e de consciência de diocese.

 Não é fácil, mas é possível e necessário. Para isso precisamos de permanecer unidos em Jesus Cristo, aprofundando o sentido de fraternidade no clero, nas paróquias e instituições eclesiais. Precisamos de reavivar o sonho e trabalhar com alegria para uma Igreja Diocesana com um rosto novo, atraente, acolhedor e próximo, uma Igreja que procura viver verdadeiramente segundo o Evangelho.

Com a ajuda e a intercessão de Maria, Nossa Senhora da Conceição, padroeira da diocese de Vila Real, a celebração deste Ano Jubilar que assinala o centenário da sua criação, sirva para tornar mais viva a nossa memória, grata a Deus e a todos os que fizeram parte deste belo caminho; desperte em todos, clero e leigos, um renovado ardor e paixão na missão de servir esta Igreja e este povo; estimule um compromisso mais forte em reforçar os laços de comunhão fraterna entre todos, para que continuemos a caminhar juntos na história, cumprindo os desafios do Espírito.

Que Deus nos abençoe, nos proteja e nos acompanhe.
E Nossa Senhora da Conceição interceda por nós.

8 de dezembro de 2021, Solenidade da Imaculada Conceição

+António Augusto de Oliveira Azevedo

Bispo de Vila Real

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