Homilia – Ordenações – Julho 2025

O dia das ordenações é um dos dias de maior significado na vida da diocese. Dia de particular alegria para as famílias, para o presbitério e para as várias comunidades implicadas na vida e no percurso formativo dos ordinandos. Mas é sobretudo um dia de grande esperança. Esperança de que a vida e ministério dos novos presbíteros seja uma benção para toda a igreja diocesana.

Acima destes belos sentimentos, a Palavra de Deus surge nestes momentos sagrados como o farol que ilumina o nosso caminho, a luz que alarga horizontes e faz ver o essencial. No relato do evangelho de hoje, Jesus começava por fazer três coisas decisivas: contemplar a seara, convidar à oração e enviar em missão. O momento que aqui  vivemos, longamente preparado, envolve essas três dimensões. Em primeiro lugar, o Senhor convida-nos a contemplar a seara, a reconhecer a sua dimensão e a insuficiência de trabalhadores. Sempre foi assim desde o início: é grande a vastidão do mundo, é enorme a diversidade de pessoas e culturas, a que hoje acresce uma sociedade mais complexa, uma comunicação mais rápida, além de novos desafios que se vão multiplicando. Como Jesus, há que olhar a messe com realismo mas sem medo, como o campo a trabalhar, contagiados pelo seu sagrado coração cheio de  compaixão e misericórdia pela sorte do seu povo.

Como Ele nos recomendou, é indispensável rezar, a forma mais profunda de expressar a nossa confiança de que Ele não nos abandona. Ele é o verdadeiro dono da messe e chama-nos a ser seus fiéis colaboradores no cuidar da messe. Finalmente ordenou: Ide. Este imperativo deveria ajudar cada cristão, e por maioria de razão cada sacerdote, a sentir-se «discípulo missionário», na bela expressão do saudoso Papa Francisco. A contemplação e a oração confiante devem desembocar em ação eficaz. Somos todos enviados, pelo que não se compreende, na vida da Igreja, gente instalada, algum atavismo, resistência à mudança ou medo de arriscar. À velocidade a que o mundo muda não é opção ficar parado, carpir lamentações ou exaltar saudosismos. Ide, continua a ser a palavra de Jesus, dirigida a quem é ordenado sacerdote mas também a todos os cristãos.

Àqueles que enviou dois a dois, significando assim que a missão é partilhada e não por conta própria ou segundo caprichos pessoais, mas discernindo a vontade de Deus e na obediência ao que a Igreja pede, Jesus apontou alguns conselhos de grande atualidade para a vida sacerdotal.

O primeiro conselho («ovelhas no meio de lobos») poderia ser traduzido como prudência, ou seja, a sabedoria de perceber os lugares ou meios a que se é enviado. Santidade não se conjuga com ingenuidade ou imaturidade, antes com o realismo que leva a saber agir bem em cada situação. Seja em situações mais adversas, seja em contextos sociais mais difíceis, em ambientes mundanos ou nos meios digitais, ao ministro de Cristo pede-se que saiba ser fiel à missão e dar testemunho da sua fé.

Jesus acrescentou ainda outras recomendações preciosas e de grande utilidade para os discípulos de todos os tempos. Àquele que é chamado e enviado em seu nome, o Senhor aconselha um estilo marcado pela simplicidade, proximidade e autenticidade. No exercício do ministério sacerdotal podemos facilmente ficar apegados a bens, condicionados por ambições ou preocupações ou então deixar-nos seduzir por futilidades e distrações que nos desviam do essencial da missão. Cultivar vidas simples, disponíveis para o serviço dos irmãos, centradas no que importa, é um testemunho que o mundo carece e que tantos começam a buscar.

Aos discípulos enviados, o Senhor pediu ainda que fossem portadores de paz e anunciadores da proximidade do Reino. A esta luz, a vivência do presbiterado deve constituir sempre um sinal de paz e de esperança para o mundo.  Num momento em que se multiplicam guerras e cresce uma preocupante banalização da retórica belicista e uma perigosa polarização das sociedades, um ministro da Igreja, deve ser um incansável profeta da paz. Uma paz assente na justiça e no respeito pelo outro, forjada no diálogo e não imposta pelas armas. A paz nas famílias e no mundo, será causa que requer o compromisso e oração dos crentes. Além dessa, o anúncio do Reino de Deus será a mensagem a que o sacerdote entregará o melhor do seu tempo, energias e capacidades.

Ser construtor de unidade e de paz foi precisamente o tema que o Papa Leão XIV escolheu para a sua mensagem recente Dia Mundial de Oração pela Santificação dos Sacerdotes. Nela sublinhava que «ser construtor de unidade e de paz não significa impôr-se mas servir», implicando «oferecer propostas pastorais que geram e regeneram a fé, construindo boas relações, laços de solidariedade, comunidades onde brilha o estilo de fraternidade». A fraternidade é de facto o estilo essencial da vida presbiteral. Fraternidade que liga o Padre a todos os irmãos e particularmente a fraternidade sacerdotal que «que se torna o sinal crível da presença do Senhor Ressuscitado entre nós», acrescentava ainda o Papa.

Este laço fraterno que o une aos irmãos, decorre para o sacerdote do laço sagrado que o une a Cristo. O Sacerdote é amigo daquele Senhor que nos chamou amigos. «Esta amizade com Cristo é o fundamente espiritual do ministério sacerdotal, o sentir do nosso celibato e a energia do serviço eclesial ao qual dedicamos a vida. Ela sustenta-nos nos momentos de provação e permite-nos renovar a cada dia o SIM pronunciado no início da nossa vocação», disse ainda recentemente o Papa num Encontro Internacional sob o tema: «Sacerdotes felizes».

A felicidade é precisamente o clima que reconhecemos na parte final do relato evangélico quando os setenta e dois retornam até junto de Jesus. Chegaram cheios de alegria porque a missão tinha superado as suas expectativas, era grande o seu entusiasmo porque tinham conseguido fazer o que nunca tinham imaginado. Este é um dos grandes encantos da vida sacerdotal. Temos possibilidade de realizar, com a força do alto, tantos coisas que ultrapassam a nossa compreensão e os nossos cálculos e previsões.

Caros ordinandos: É belo ser sacerdote neste tempo. Cada um é chamado a experimentar esta mesma alegria do evangelho. Além da alegria natural do dia da ordenação sacerdotal em que o coração está cheio de sonhos e ideais, o sacerdote é desafiado a nunca desistir de buscar aquela alegria única, insuperável, de quem se entrega ao serviço dos irmãos, reconhecendo que é sinal e instrumento da salvação de Deus em favor do seu povo.

Essa alegria não é uma alegria fugaz que advém dos êxitos pessoais ou sucessos pastorais, do reconhecimento social, do número de likes ou seguidores, mas aquela que resulta da consciência de que «os vossos nomes estão inscritos nos céu», de que o Senhor recompensa com generosidade o trabalhador fiel.

Para alcançar essa alegria há que acalentar e avivar o fogo do Espírito recebido na ordenação, deixar que a graça de Deus presente neste sacramento sempre vos santifique. «Não tenhais medo da vossa fragilidade: o Senhor não procura sacerdotes perfeitos mas corações humildes, abertos à conversão e prontos a amar como Ele nos amou», acrescentava o Papa na já referida mensagem. Acautelai-vos do fermento da malícia e perversidade, do veneno da maledicência, da ilusão do bem-estar ou da tentação do egoísmo.

Acima de tudo estai sempre prontos para, unidos à cruz de Cristo, testemunhar as marcas, os sinais que vos identificam com Ele como referia São Paulo em tom pessoal. Estai sempre disponíveis para servir a Igreja, para caminhar juntos com o Povo de Deus em verdadeiro espírito sinodal.

Neste dia o Senhor vos confia uma grande missão e vos envia a trabalhar incansavelmente na sua messe. A Igreja diocesana alegra-se com a vossa disponibilidade e deposita em vós uma grande esperança.

Que o Senhor seja sempre a vossa força e Maria, sua e nossa Mãe, vos proteja e ampare.

 

Vila Real, 6 de julho de 2025

+António Augusto de Oliveira Azevedo

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