No dia centenário da dedicação desta Igreja de São Domingos como Catedral da diocese de Vila Real estamos reunidos para uma solene celebração de ação de graças. Este lugar consagrado para ser a casa-mãe da diocese testemunhou os momentos mais significativos da sua história secular. Ao longo deste tempo Deus aqui acolheu o seu povo e lhe concedeu muitas graças.
A catedral, sede do Bispo, é casa de família de todos os cristãos, onde a comunidade diocesana se reúne nas ocasiões mais festivas ou solenes. Ela é expressão visível da comunhão do Bispo com o clero a ele unido, com os religiosos e religiosas, com os leigos e todos os movimentos e instituições eclesiais. Aqui nos sentimos em nossa própria casa; aqui vimos à fonte de onde partimos confirmados na mesma fé e na missão comum de anunciar o Reino.
Neste lugar consagrado como casa de oração, casa dedicada a Deus, a sua palavra ecoa e o silêncio fala. Nele tem início a sementeira da palavra que continua a ressoar em todas as Igrejas das nossas aldeias, vilas e cidades. Daqui irradia a torrente de graça que santifica os crentes, simbolizada nos santos óleos benzidos na Páscoa e usados na celebração dos vários sacramentos. Aqui são ungidos aqueles que, recebendo o ministério de presbítero ou diácono, são enviados em missão de santificar e apascentar o povo de Deus.
Neste momento e lugar damos glória a Deus. Fazemo-lo com as nossas orações e os nosso cânticos, com uma liturgia solene, a forma litúrgica mais plena. Nesse sentido, as celebrações eucarísticas nas paróquias reforçam este louvor porque são realizadas em comunhão com o Bispo e em união com o Santo Padre. Por outro lado, também a arte presente nesta Igreja é proclamação da glória de Deus e os momentos culturais aqui realizados, nomeadamente os concertos, elevam o espírito para a sua contemplação.
Neste dia somos convidados a tomar mais consciência do significado da Catedral na vida da Igreja e a amar mais a nossa Sé.
Hoje a liturgia da Igreja celebra a solenidade de Cristo, Rei e Senhor do universo, pelo que a nossa oração de ação de graças inclui a profissão de fé de que Jesus é Rei e Senhor e a súplica renovada de que venha o seu Reino.
No relato do Evangelho, Jesus admite perante Pilatos que é Rei. Depois de tantas vezes ter escapado às multidões que o quiseram fazer Rei, finalmente, num momento de solidão e fragilidade, Jesus afirma a sua realeza. Porém esclarece que esse Reino não é deste mundo. Não o tinha percebido Pilatos nem as multidões, não o tinham entendido os discípulos e ao longo da história do cristianismo este equívoco foi constante. A tentação de reduzir o Reino de Cristo ao “nosso reino” é permanente, de o confundir com os nossos interesses, necessidades ou opções.
Para entender a novidade deste Reino precisamos, antes de mais de contemplar aquele que está diante de Pilatos, acusado injustamente. De contemplar aquele que morreu na cruz, o seu verdadeiro trono. Por isso ao entrarmos nesta catedral temos diante de nós a cruz e o altar, símbolos da verdadeira realeza de Cristo.
Dessa contemplação e da escuta do evangelho aprendemos que o seu Reino é de paz. Não mobiliza exércitos ou se impõe pela violência ou pela força das armas. A história do passado e a que se escreve no presente está cheia de reinos e impérios construídos sobre escombros de crueldade, morte e sofrimento; todos se julgaram eternos e invencíveis mas todos pereceram pelos mesmos métodos. Os cristãos continuam a acreditar que a paz anunciada e testemunhada por Jesus é um desafio para o mundo. Não podemos desistir de acreditar, rezar e trabalhar pela paz.
Jesus apresenta-se ainda como aquele que, sendo rei, veio ao mundo «dar testemunho da verdade». Ele anunciou a palavra da verdade sobre Deus e o homem, confronta-nos sempre com a verdade mais profunda sobre nós mesmo. Contudo vivemos numa cultura que se diz de “pós-verdade”, em que esmoreceu a paixão pela verdade, nos mais variados âmbitos, em que há uma cedência preocupante à mentira e à manipulação. O crente é um buscador da verdade e, como Jesus, é sempre testemunha fiel e humilde da verdade, consciente de que é a partir dela que se tudo se constrói (na vida pessoal, nas instituições, na sociedade).
O Reino que Jesus pregou e inaugurou tem uma outra forte marca, a do amor. Aquele que nos ama, aquele cujo coração foi trespassado, como lembra o Apocalipse, é que virá no fim dos tempos em todo o seu esplendor e glória. É o seu amor que tudo vence; é sempre o amor que tudo vence. Talvez por isso o Papa Francisco, na sua recente encíclica vem lembrar a necessidade de voltar ao coração. Isso significa valorizar a proximidade entre pessoas, não se deixando que a tecnologia se sobreponha a outras dimensões de maior humanidade. Significa ainda viver um cristianismo a partir de dentro, de um coração convertido, unido a Cristo e aberto aos irmãos.
Proclamando o reino de Cristo, reino de paz, verdade e amor, neste dia reforçamos a nossa esperança de que esse reino cresça em nós e chegue um dia à sua plenitude. Para avivar essa esperança, ao sairmos desta catedral contemplemos a sua rosácea onde sobressaem as letras gregas «Alfa» e «Ómega», precisamente a mensagem que ouvimos no Apocalipse. Essas letras referem-se a Cristo, Senhor do universo «Aquele que é, que era e que há-de vir».
A esperança em Cristo Rei dá-nos força para construir o seu reino e caminhar até à meta. Esta é a mensagem que o Papa endereça aos jovens, neste que é o Dia Mundial da Juventude: «A esperança vence todo o cansaço, toda a crise e toda a ansiedade, dando-nos uma forte motivação para avançar porque é um dom que recebemos do próprio Deus. Ele enche o nosso tempo de sentido, ilumina-nos o caminho, indica-nos a direção e a meta da vida(…) A esperança é uma força nova que Deus infunde em nós que nos permite perseverar na corrida, que nos dá uma “visão de longo alcance”, que ultrapassa as dificuldades do presente e nos orienta para uma meta concreta: a comunhão com Deus e a plenitude da vida eterna».
Que esta casa de Deus e casa-mãe da diocese continue, por muitas gerações, a ser lugar de onde irradia uma mensagem de esperança e de paz para todos, uma mensagem de vida e de salvação.
Vila Real, 24 de novembro de 2024
+ António Augusto de Oliveira Azevedo
Diocese de Vila Real Diocese de Vila Real