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A Paz e a Família, na Vida Oculta de Jesus

No primeiro dia do ano celebra-se a Solenidade da Mãe de Deus e o Dia Mundial da Paz. O Papa Francisco pede: “Vence a Indiferença e Conquista a Paz”. Denuncia a prática da indiferença, a falta de compaixão e misericórdia e o materialismo prático, com o seu falso humanismo, o relativismo, o niilismo e a insensibilidade dos bem informados, que vêem os necessitados e passam ao lado, incrementando a violência e a indiferença.

1.- Jesus proclama bem-aventurados os construtores da paz, porque serão chamados filhos de Deus (Mt.5,9), e exorta ao amor e à reconciliação. A paz não é mera ausência de guerra ou o equilíbrio de forças adversas (G.S.77), mas “obra da justiça” (Is.32,7), fruto do Espírito e vitória humana, na admirável sinergia da graça divina e da liberdade humana, pois, como diz S. Agostinho: “Deus, que te criou sem ti, não te salva se tu não quiseres”. “Os cristãos devem “testemunhar a verdade no amor” (Ef.4,15), e unir-se aos homens verdadeiramente pacíficos, para implorar e estabelecer a paz” (G.S.78).

 O Anjo anuncia aos Pastores a alegria e a paz. Esta é tesouro de quem faz o que Deus quer. “Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens do Seu agrado” (Lc. 2,14). A Vinda de Deus, para nos salvar e dar alegria, que os Anjos anunciam, é Evangelho, Boa Nova, grata e alegre notícia, que a humanidade espera. Deus nasce homem para nos salvar e contratar para a renovação do mundo, com a reconciliação e a paz, seguindo os ditames do Reino de Deus, que não é do mundo, mas está no meio de nós.

2.- A Encarnação é o supremo milagre, que nos traz o Filho de Deus, nos dá a paz e mostra a misericórdia do Pai, o modo de agir de Deus, para vivermos, na solidariedade, perdoando e sendo misericordiosos, como Ele. A misericórdia é a arquitrave da Igreja, que exorta à conversão, à reconciliação e ao diálogo e a viver, como Deus nos pede.

Maria, a Mãe de Deus, é o exemplo da cooperação. Obedece, para o Filho de Deus assumir carne humana no seu ventre. Deixa-se guiar por Deus. Concebe, crendo, e livre, dócil e atenta, medita e cresce na fé e na entrega. E Deus que vê a sua humildade fez nela grandes coisas (Lc. 46-48). Obra-prima de Deus é bendita entre as mulheres e bendito é o fruto do seu ventre, o qual, como diz o canto natalício: “do seio da Virgem Maria nasceu a Divina Graça, o Verbo entrou e saiu por ela, como o sol pela vidraça”.

O Filho de Deus encarnado é o rosto e fotografia humana do amor do Pai e revela-nos o mistério da Trindade. Por sua vez, a Festa da Sagrada Família sublinha um aspecto do mistério da Encarnação, na vida oculta, em Nazaré, onde Jesus cresceu, em estatura, sabedoria e graça. O que se passa, em Maria, é obra do Espírito, o Santo, que dela nasceu, é Filho do Altíssimo (Lc.1,35), que vem do Pai e Jesus, como homem, não tem pai biológico. A casa verdadeira do Filho de Deus Encarnado é a casa do Pai, no qual vive, donde vem e para o qual volta. A família de Nazaré dá a Jesus o espaço humano, o berço e a escola da aprendizagem humana e o primeiro púlpito da pregação, anúncio e dom, que recebeu do Pai, para nos dar. A vida oculta do Senhor em Nazaré prepara a Sua Vida Pública e Mistério Pascal. Pode parecer irrelevante viver, obedecer, trabalhar e permanecer no silêncio durante trinta anos, mas não é. Os caminhos de Deus são imponderáveis e a vida silenciosa e obediente de Jesus tem muito a ensinar-nos.

3.- Os 30 anos de vida oculta de Jesus, em Nazaré, foram muito importantes para o desenvolvimento da Sua personalidade e para a aquisição da auto-consciência da Sua condição divina e messiânica. O reencontro de Jesus, no Templo, lança um raio de luz sobre o desenvolvimento da vida oculta do Senhor e sobre a importância da Família, instituição natural e insubstituível, na descoberta da consciência pessoal, na criação de relações solidárias e no incremento da comunhão humana, eclesial e social. Durante 30 anos, Jesus cresce, aprende, abre-se, obedece e vive em família. A Sua “vida oculta” precede o curto, rápido e fulgurante período da Sua vida pública e pregação. No tecido de relações, na Família de Nazaré, Jesus aprendeu a falar a língua, os costumes, para a Si mesmo se auto-perceber, como pessoa diferente, como Filho Unigénito proveniente de Deus e Seu enviado. Foi, na Família, onde aprendeu a profissão, foi educado e criou relações de solidariedade com Deus, com o mundo e os outros. Foi lá que aprendeu a amar humanamente, a sonhar, a alegrar-se, a conviver e a sofrer, enquanto homem. A vida oculta é silêncio, trabalho, aprendizagem, fidelidade e obediência. Jesus cresce em idade, sabedoria e graça, e adquire a consciência humana da Sua condição de Filho Unigénito, sem deixar de aprender a obedecer e de ser submisso a José e a Maria.

É esclarecedor o relato de Lucas, sobre o reencontro do Menino Jesus, no Templo, que nos transmite as primeiras e únicas palavras de Jesus, antes da vida pública, que abrem uma janela sobre o mistério da auto-consciência humana de Jesus. Maria interroga e censura o adolescente de 12 anos: “Filho por que nos fizeste isto? Olha que teu pai e eu andávamos aflitos à tua procura”. E Jesus, consciente de Si, responde: “Porque me procuráveis? Não sabíeis que devo estar em casa de Meu Pai?” (Lc. 2,48-49).

Estas palavras do Senhor constituem a Sua primeira catequese e pregação, em que Ele corrige e desmonta a convicção dos que o viam integrado, no ambiente natural da sua família de Nazaré, que é importante. José e Maria são importantes, mas o essencial é só o Pai que O enviou e, por isso, Ele se delicia e quer estar, com o Pai e fazer o que o Pai quer. Na resposta de Jesus a Sua Mãe, Maria Santíssima, Jesus revela duas coisas, fruto da Sua auto-consciência humana acerca da Sua condição e filiação divina. O pai de Jesus não é São José, que era só pai adoptivo e legal, aos olhos do mundo e da Lei. Maria diz “teu pai”, por comodidade, em público, sublinhando a dedicação e a acção educadora de S. José, como guarda fiel da Sagrada Família. Depois a Casa de Nazaré, sendo importante para Jesus, não é a Sua verdadeira casa, pois, Ele vem do Pai e volta ao Pai, que o enviou, sendo objecto da Sua complacência estar, no Pai e com o Pai. 

4. – A Família é o berço e ambiente natural, necessário e insubstituível, onde os filhos nascem, crescem, tomam consciência de si, estabelecem relações de solidariedade, de paz e união com os humanos. A Família é o cerne e microcosmos da sociedade. Os pais são, até certo ponto, insubstituíveis, para os filhos e estes não são escravos e joguetes dos pais, mas dom, tarefa e promessa para a sociedade que são chamados a edificar, com o seu contributo. Os filhos não são coisas, nem bonecos e brinquedos dos pais que devem respeitar, promover e ajudar os filhos a serem livres e inter-dependentes, responsáveis, generosos e participativos. É prejudicial a educação, que infantilize e esmague, como o é a que permite tudo, prescinde da obediência, acabando por criar futuros déspotas, infelizes, que nada de bom dão e prometem à sociedade. Os filhos de hoje são os pais e adultos de amanhã. Assim, é fundamental a educação dos novos.   

Se, nas famílias, houver sentimentos e práticas de perdão, gratidão e misericórdia, é natural que se formem pessoas de bem, misericordiosas, magnânimas e pacíficas. Para criar uma sociedade solidária e vencedora da indiferença é fundamental apostar nas famílias e nos valores em que elas e a sociedade se devem alicerçar, para conquistar a paz entre os humanos, arrancando de nós os preconceitos, o ódio e todas as formas de indiferença, que potenciam a dureza do coração, que se opõe à paz e gera a violência, no mundo, onde se vive um ambiente de guerra em folhetins, como diz o Papa.

Os cristãos apostem, na unidade do necessário, na liberdade do duvidoso e no amor, em tudo e sempre, como diz S. Agostinho, foi o programa do Papa S. João XXIII e recomenda a Constituição da Igreja no Mundo Contemporâneo (G.S. 92).

“O Deus da paz que, pelo sangue da Aliança eterna, ressuscitou dos mortos o grande Pastor das ovelhas, Jesus Cristo, nosso Senhor, Vos torne aptos para todo o bem, a fim de fazerdes a Sua vontade, realizando Ele, em nós, o que é agradável aos Seus olhos, por Jesus Cristo, ao qual seja dada a glória, pelos séculos. Ámen. (Heb. 13, 20-21).    

+ Amândio José Tomás, bispo de Vila Real.

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